10 de janeiro de 2012

Não me peça isso,
é muito perigoso abrir os braços a essa hora da noite
Há muita gente sozinha lá fora, revirando corações de lata
e não é seguro te dizer o que penso nessa hora
sem ritmo ou água

Se insistir, terá de vasculhar nesse quarto
algum canto que possa chamar de longe,
um ponto do qual possa me olhar com vertigem e dúvida nos olhos
e que haja um vácuo entre nós
onde chovam tâmaras
secas de tanto concebidas

Este quarto sempre foi um mundo 'a parte,
e todas as vezes em que você bateu delicadamente na porta
entrou como um alienígena
um monstro na ponta dos pés
a devorar toda a antítese e todo o pão
até que enfim restassem,
dois corpos dispostos na cama
a ouvir um outro mundo se erguer do outro lado da vidraça
todo som e calor,
um mundo que nasceu agora e,
debochado,
já traz uma historia e uma enciclopédia consigo,

pois não me peça isso,
deixa as tuas historias na porta como se fossem sandálias sujas,

este é um outro quarto,
e sempre só houve ele,
e no futuro,
ao saíres pela porta,
habitarás outro mundo único,
e este hoje não terá nenhum valor na nova terra,
estes braços, um quarto que não se abre enquanto não
atira tua sandália ao deserto faminto

estes braços, tuas mãos, essa vidraça,
elementos provisórios dessa noite
cada vez mais extensa,
mais uma serpente absurda a brotar
dentro da mais noturna das tâmaras
a suspender
esse quarto câmara-clara,
que não se sabe quanto de febre e noite
e chora com braços encruzilhados

entra, deite-se,
e não me peça isso
não vou ler os sonhos das ultimas noites
não porei sal nas tuas chagas,
é muito perigoso abrir os braços nesse momento
essa hora sem ritmo ou água.

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