15 de maio de 2024

parimos para perdê-los

os temos para não tê-los

nascidos e não conhecidos

por eles tememos

tão logo os temos 

por eles morremos

por eles perdidos pedimos

por eles, por eles.


quem é jovem o suficiente 

para parar o que passou

dos limites e ainda insiste?


quem é vivo, velho e belo

o suficiente para lembrar

o mais que esquecido, nunca sabido,

vivo e velho e belo passado?


quem é rebelde o suficiente

para que sua revolta recobre

quem já não mais volta?


parimos para perdê-los

os temos para não tê-los

nascidos e não conhecidos

por eles tememos

tão logo os temos 

por eles morremos

por eles perdidos pedimos

por eles, por eles.

8 de maio de 2024

Catexia


Quando eu aprendo uma coisa nova

eu que sou tão estabanado

que preciso de mim tantas vezes

para trocar uma lâmpada

eu vou correndo contar pra você

com a troca daquela fechadura

eu que nada sei de pontas e parafusos

te liguei e disse: eu juro!

agora ninguém mais me invade

senhor que sou de meus próprios apuros

como a devolução daquela carta mal endereçada

da Islândia por uma foca desfocada

achei os meus meios de se entender

com os leões-correios

e sem muitos enleios fi-la chegar

ao correto despenhadeiro


Tem dias em que aprendo algo e não lhe conto...

que a coisa 

nova aprendida

é justamente a descoberta solitária

dessas jazidas 

de vida

Eu tô... eu tô!...  eu tô há anos

pra te contar sobre

uma certa joaninha

e adivinha!!!!

ainda me lembro bem do

rosto dela como se fosse amiga minha

(isso vai assim à pressa escrito

porque não ligo e lhe amigo)

de dentro da minha festa

te mando um beijo na testa

e uma palavra sussurrada no fundo do umbigo.


5 de maio de 2024

Ei!

Eiiiiiiiiiiiii!!

que bom que você veio!

hoje tá mais legal o recreio...

ontem a tarde foi lenta e vazia

e até o lanche que a tia me deu

tava sem gosto e sem recheio!


que bom que você veio!

hoje o filme não fica pelo meio...

ontem me bateu uma preguiça

dormi logo no começo

mas contigo o filme passa ligeiro!


que bom que você veio!

hoje não fico de fora, de escanteio...

ontem, sozinho, fiquei horas na TV

contigo sou parque, praia, 

pique-esconde, pipa solta no barreiro!


meu amigo querido, que saudade de você.

a alegria que eu tenho de saber 

que o meu poema eu te dei em vida

que você leu o seu poema em vida

que a nossa história não foi

curta nem comprida foi cumprida

foi cantada e foi vivida.


pelos caminhos por que erro

eu levo, querido amigo

o seu nome para perto de outros afetos

restou uma buraco gigante no espaço 

e é assim que nessa teia me completo

com abraços apertados, 

com risos cantados

e encontros secretos.


você sabia que amor e política se faz todo dia,

e que nessa singular economia

o afeto é como uma comida, se partilha.

e que a mais forte e micro política é essa

dos encontros e confrontos

te amo muito e pronto, 

já não tenho o que dizer

você sabia que amor e política se faz todo dia

eu trato de cultivar meu jardim de novos afetos

mas que posso fazer se numa tarde deserta

tão propensa a novas descobertas

ninguém mais chá de boldo me oferta

como você fazia?

eu vou é viver com alegria

e celebrar em cada canto

o que neles há de mais valia.


Eiiiiiiiiiiiii!!

que bom que você veio!

hoje tá mais legal o recreio...

ontem a tarde foi lenta e vazia

e até o lanche que a tia me deu

tava sem gosto e sem recheio!


que bom que você veio!

hoje o filme não fica pelo meio...

ontem me bateu uma preguiça

dormi logo no começo

mas contigo o filme passa ligeiro!


que bom que você veio!

hoje não fico de fora, de escanteio...

ontem, sozinho, fiquei horas na TV

contigo sou parque, praia, 

pique-esconde, pipa solta no barreiro!


1 de maio de 2024

Anatomia do Espectador I

cigarro devidamente pisado

as chamas do cu controladas

é hora de fazer pose charmosa

e penetrar por entre cortinas

para ter seu corpo esquadrinhado

pelos que estiverem no palco

não se pode confiar em ventiladores

nem em alheios pudores

venha com pouca roupa agora

que há tempo se mostrar na ágora

na falta de água é melhor se levantar

discretamente - nem pensar tossir!

tossir é sempre pior que, ops!

deixar o fogo no rabo

pegar no tecido barato do forro e

encerrar a peça ali em meio ao ato

como foi a peça, meu amor?

oh, que delícia de encenação!

no palco um teatro de restos

na plateia rostos perdidos sem rastro

o fogo sem lastro de mão

em mão roubado

e o coro, naturalmente, comendo.