6 de dezembro de 2008

O início, o fim e o meio


À meia luz, dançamos.
E meias-entradas pagamos. O cinema, o teatro, a vida, o tempo...
Só pagamos metade. O resto se paga sozinho.
Em meio a tudo isso, deslizam cores à procura de suas telas.
Estamos meio idosos, meio velhos, meio experientes, meio mortos.
Estamos na meia-vida. Sim, estamos.
Já não bebemos taças e taças de vinho. Somente meia.
Pés descalços? Nada disso! Sempre com meias!
E meias-calças? Você não usa mais.
Foi-se o tempo em que eu as retirava, lentamente, buscando suas coxas lisas. Foi-se o tempo em que você se irritava com os rasgos que surgiam nelas.
Esse tipo de prazer já não nos satisfaz como antes...
O sexo soa meio desnecessário. Deveria soar? Não sei. Talvez.
Não é uma questão moral ou natural... É um produto do tempo.
Nossa cumplicidade integral tornaria o sexo incestuoso.
Você é minha mãe, minha irmã, minha mulher.
Sexo é para estranhos. Sexo é para inocentes.
Sabe? Somos cúmplices, culpados pelo crime de viver uma só vida.
Reconheçamos:
Somos meio diferentes, e por isso, meio estranhos.
Cada palavra que pronunciamos é um meio-termo.
Cada palavra é resultado de uma média aritmética:


O que um pensa + o que o outro pensa
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O que somos

Mas, afinal. O que somos, mulher?
Somos meio, meio... como posso dizer...
Meio incompletos.
Incompletos?!!!? Como podemos viver uma só vida, e ainda sim, nos sentirmos incompletos?!
Eu não sei, eu não sei... não posso saber tudo. Não quero saber tudo. E sei que você não quer. Você gosta desse amor ignorante que ama e não sabe porquê.
Você e eu gostamos dessa ignorância, dessa ignorância sadia. Ignorância que ri do que não sabe.
Os amigos nos perguntam: por que se casaram; por que tiveram filhos; por que razão vocês ainda mantêm esse amor de forma tão firme... E nós, com uma delícia nos olhos e nos lábios, respondemos em coro, como as crianças:
── Por que sim! Por que sim!

Você é meio triste por chegar até aqui e ainda estar incompleta?
Se for, nunca transpareceu nos meios-beijos, meios-choros e meios-sorrisos que me deu.

Não, eu tenho certeza, você é feliz.
Você não é mulher forte que arrebata tudo e vai embora quando se entristece.
Também não é mulher fraca que, diante da infelicidade, tenta adaptar-se à ela, esperando que um dia a situação melhore.
Aliás, nem mulher você é!
Você ainda é aquela adolescente,
Perdida entre sonhos de menina e de mulher.
Tuas cãs, teus pijamas, teus netinhos, teu corpo velho.
Eles gritam pra você.
── Olhe, querida, o que trouxemos pra você!
O início, o fim e o meio embalados num pacote.
Já passamos por todos eles, meu amor.
Não importa quanto tempo passe,
Sempre estamos bobos,
Curtindo o meio,
Estamos sempre no meio de tudo,
No meio da vida, no meio do salão...
(Agora sou somente eu quem grita)
── Olhe! Olhe, minha linda!
Não somos nós, ali no meio do salão?
Eu meio tenso, adolescente inseguro,
E você meio confusa (aquela perdição em sonhos, lembra?)
E tudo estava ao meio.
Meio tempo, ambiente meio romântico.
Meio bossa, meio rock,
Meio valsa, meio pisão no pé.
Lá fora, uma meia chuva cai...
E nós ali. E nós aqui.

À meia luz, dançamos.