22 de dezembro de 2019

leituras afetivas

tomar um café da manhã na casa
da infância de Adélia prado

(o olho de esguelha
no pai de Adélia
a ver se era mau)

voltar aos anos vinte
pra almoçar com Fernando pessoa
em algum restaurante barato e discreto
perguntar mais do que as cartas
sobre Ofélia
perguntar se amava-lhe mais
a robustez dos braços
ou o nome afogado

tentar chegar a Ítaca
montado numa bicicleta
furtada de algum filme
de jacques tatit
e se não for lá isso tudo
voltar e declarar
o enfraquecimento do mito

tarde da noite ligar para ana cristina César
mijar de cima de um poste
observar os garotos alados na noite
de São Paulo
cerveja na mão como se chama?
eu me chamo roberto piva

rodar o Rio até se deparar
com a beira da praia
ou com rubem braga

alta noite, piscar para
a lua leminskiana
sem lume e sem namorado
& já bêbado e moribundo
bater cansado à porta de Adília lopes
em busca de amorosos conselhos

9 de dezembro de 2019

os pássaros ultimamente
têm acordado mais cedo
como nós - exaustos
ainda bonitos
ainda intensos
ainda cantam
              cantam
cantam
derrubando frutos das árvores
e postes de luz
ainda cumprem a noite por toda parte
só não inventam
como dantes