27 de novembro de 2010

sobre um romance de Italo calvino



primeiro de tudo, preciso dizer que li este livro num momento ruim, uma semana de muito cansaço e stress. por vezes, sentado em algum lugar, adormeci no meio de algum trecho. dizer isso tem uma conotação de desculpa pro que vou dizer, que é que gostei do livro, achei a ideia genial, mas como leitor despreocupado, 'não foi tudo aquilo", de modo que o livro não entrou para os favoritos. (como eu achava que iria acontecer - quem sabe numa releitura?). Essa preocupação em dar desculpas é covarde e tola: eu deveria simplesmesnte dizer "gostei, mas esperava mais, o que é natural" (bom, acabo de dizer). É um romance sobre o ato de ler romances, tanto que o protoganista chama-se simplesmente Leitor. Este leitor sofre com diversos percalços para terminar a leitura de seus livros. sempre que inicia um, algo acontece, o romance é interrompido, o gozo é cortado, e logo ele é atirado a outro começo de romance - que irá ser ceifado também. E por que não gostei tanto assim? Difícil. A ideia do livro é genial, e há passagens maravilhosas (vou botar pelo menos uma aqui no blog), mas creio não ter entrado nessa busca do leitor. alguns começos de romances - todos bem diferentes entre si - não me prenderam, e o enredo rocambolesco da procura do Leitor me enfastiou em alguns momentos. Quanto ao fim do livro, fiquei com a sensação de pé quebrado, embora seja impossível terminar de ler sem um sorriso diante do gracejo com que Calvino termina ser romance sobre romances. Acho que é isso: o enredo rocambolesco enfastiou, apesar das reflexões geniais sobre a leitura e de belas passagens. Calvino é um cara muito inteligtente. Outra coisa: ao fim do livro, há um apêndice que traz a resposta de calvino às indagações de um crítico italiano sobre o livro. Assim, ficamos conhecendo as intenções do autor. sobre esse apêndice, uma coisa me ocorre no momento. é sobre esse trecho: "Será mesmo verdade que meus incipit se interrrompem? Alguns críticos (...) e alguns leitores de gosto refinado sustentam que não: eles os consideram relatos acabados, que dizem tudo que deve dizer e aos quais não há nada para acrescentar. Sobre esse ponto não me pronuncio. Posso dizer que, de início, queria fazer romances interrompidos (..)" - Aqui tenho um pitaco. Alguns começos, incipits, possuem uma estrutura perfeita de conto - o melhor exemplo pra mim é "Ao redor de uma cova vazia" que é excelente, e é em certo ponto fechado. Se Calvino quisesse continuar, teria problemas porque muito já foi dito, e falar mais tenderia a ser "chuva no molhado". Além disso, esse incipit termina tão bem, com uma bela cena digno de conto excelente. Há outros exemplos de incipit-contos, mas discordo de quem vê em todos os inícios contos acabados. Não é bem assim, parece-me. "numa rede de linhas que se entrelaçam", por exemplo, até pode ser chamado de relato completo... mas então teremos de assumí-lo como um relato ruim, em que as cenas desenham-se mal - que faltou mais organização, o que seria um absurdo já que sabemos da capacidade fodástica do Italo de conduzir uma narrativa. Bem, o pitaco fica por aqui. A leitura está recomenda. E, bem, foi o primeiro livro dele que li. Mas tenho certeza, só de ler as outras sinopses, de que vou gostar mais de outras obras dele (eduardo, é impressão minha ou ainda você está tentando desculpar-se?). Palomar e As cidades Invisíveis, são pitacos. Tenho certeza que a hora que lê-los (esse das Cidades vou ler nas férias, já tá marcado ;P) vou amar, só de saber o tema. Bom, agora vou tratar de digitar alguma daquelas passagens que achei foda. Ah, lembrando, o começo do romance é demais, te prende, porque fala justamente sobre as nossa manias de leitores. Assim, empatizar com elas é facílimo, já que todo mundo tem suas manias. Eu me vi, durante essas primeiras páginas, quando Italo descreve aquele leitor que compra um livro e começa a abrir no escritório, em meio a documentos aborrecedores, fingindo que está concentrado em algum deles, mas - qual!- tá é abrindo o livro cuidadosamente e curtindo as primeiras linhas. Só não contem isso pro meu chefe. esse lance de empatia foi brincadeira, tá?

adolescência

Escola?
lá esqueço
o que sei

Catequese?
Encheu
o sacro

Passado?
dancei, cara
me ferrei

eu?
sombra que ilumina
meus pais

pais?
país do
por enquanto

Futuro?
dançarei
mais um tanto

23 de novembro de 2010

eu ri

O eterno problema da tradução...
Sr. William Blake e seu sarcasmo:

"It appears to Me that Men are hired to Run down Men of Genius under the Mask of Translators"

Na tradução de Mário Alves Coutinho:

"Acho que Homens são contratados para Depreciarem Homens de Gênio sob a Máscara de Tradutores"


In: Tudo que vive é sagrado (poemas de William Blake & D.H.Lawrence). Editora Crisálida, 2001.

21 de novembro de 2010

oh, boy
mozart is gone!

but he's still dancing
in my ringtone

19 de novembro de 2010

26 grávidas, ana c,
26 grávidas e você tomam banho de sol
de longe aguarda-se que o trem em que viajas
subitamente se traia
em doidivano suco
que loucos esses ventos quando descarrilham!
parece que
multiplicam a praia.

15 de novembro de 2010

"Quem te perturba? Quem estremece teu coração? Quem tateia ao trinco de tua porta? Quem te chama da estrada sem, no entanto, entrar pela porta aberta? Ah! É precisamente aquele que perturbas, aquele cujo coração estremeces, aquele à porta do qual tateias, aquele que chamas da estrada e pela porta do qual não queres entrar".

Franz Kafka.

Uma passagem e tanto.

Citado por Harry Laus, em seu diário. (Impressões de Leituras. Editora Bernúncia.)
Não sei qual o tradutor, e nem de que obra o trecho é extraído. Talvez traduzido pelo próprio Laus, talvez extraído dos diários de kafka, que era uma leitura que ele vinha fazendo na época que transcreveu esse trecho. (novembro de 1951)

Mais tiras. Agora de Arnaldo Branco.

André Dahmer e seu rei Emir

Adorei!

http://g1.globo.com/pop-arte/fotos/2010/04/tirinhas-rei-emir.html

14 de novembro de 2010

dois poetas


sexta foi dia de ler dois livros da Letradágua, editora que costuma publicar o pessoal daqui da região Norte, e também do Vale do Itajaí. E publicam, entre outros gêneros, bastante poesia. Rubens da Cunha, Caco de Oliveira e Fernando José Karl são alguns exemplos. Dessa vez, a leitura foi de "Cápsula", de Paulo César Ruiz, poeta nascido em bauru/SP (?), mas que morou em Joinville e publicou alguns livros aqui; e "livro de mercúrio", do blumenauense Dennis Radünz.


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Ruiz faleceu cedo, em 2001, sendo "Cápsula" uma obra póstuma.Talvez seja a única reunião, em livro, de seus poemas (não sei dizer). Publicou também um trabalho no jornalismo, em conjunto de outros, e "Códice", novela experimental, na qual subverte todas as regras do gênero, além de criar vários neologismos, transformando o livro num jorro de palavras, uma viagem total¹. E eu achei uma delícia a leitura desse "Cápsula". a poesia dele é breve, rápida, e repleta de humor. daí associá-lo a leminski, alice ruiz (ó o sobrenome), nelson capucho, é um pulo. mas dizer que ruiz é "um poeta marginal" ou "muito parecido com leminski" , etc , é jogar ele num balaio, apagando o que sua poesia tem de original. Porque ruiz, assim como leminski ou qualquer um dos citados acima (exceto alice, talvez) traz pra poesia muito bom humor e deboche. Mas é um deboche, um gracejo, que só pode vir dele, do paulo césar ruiz. seus poemas falam bem melhor do que eu:

paulo césar who is
poeta de merda
o mundo sob o nariz

-
corre ambulância!
se deus não quiser
paciência

-

que chique
joguei na retranca
deu xeque


por reunir essas características, bom humor, ironia, aliadas à brevidade de seus poemas, a poesia do ruiz é ideal pra levar pra meninada, creio, a fim de despertar (preparação para emitir lugar-comum, 1, 2 3 e ...) o gosto pela poesia. falando sério, não há como não simpatizar por essa poesia. Outra característica dela é a observação do cotidiano (algo que me direciona para Caco de Oliveira, outro baita poeta atuante em Joinville). Herdada da cultura oriental, esse exercício rende poemas e tanto. às vezes, é como uma fotografia: ("deu zebra/menino de rua/à espera do penta"). Deixo um último, ideal pra exemplificar esse poeta bom pra chuchu, que observou a dor (e graça) do cotidiano como poucos. adorei o livro, entrou para os favoritos. pra fechar:

roubar a paisagem
o olhar clic rapina
turva até a neblina


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A outra leitura é bem diferente. a poesia "despreocupada" (favor não confundir com relaxada, que o trabalho do poeta é duro sempre) dá lugar a uma poesia experimental, no qual o leitor sente que as palavras foram sendo lapidadas. opa, lapidadas não, que isso tem gosto de soneto parnasiano. ceifadas, laminadas, sei lá o que, algo assim, mais bruto. Coloco aqui dois poemas dos quais gostei muito, e daí falo um pouco da leitura.

Casas Noturnas (I)

a casa mora onde obra a noite
se nenhum rumo mais a mura
ou abre e fura a hora adentro
se a água mole a pedra aflora
e afora enfurna-se o relento

Casas Noturnas (II)
a casa acesa em cinza insone
no alheio sono dos anônimos

o cisma insano de arredores
onde os ânimos são nômades

a casa ilesa em chamas some
a ânsia: ócios: coisas: nomes

Escolhi esses dois, porque os achei do caralho. (o palavrão aqui é pra reforçar mesmo, desculpa a quem não gosta). Gostei mesmo. Do livro em geral, gostei menos. A poesia desse livro me foi muito estranha, o que é bom por um lado, já que a poesia tem que estranhar às vezes, confrontar-nos com as ideias e com a nossa língua. Mas eu sempre pendo para a poesia de ideia (retomarei essa história de poesia de ideia em futura postagem), do que esta de radünz, mais experimental, cujo cerne parece estar  na linguagem original e não tanto no mote, no tema, na ideia que se quer passar (vide poemas do ruiz, bem mais "acessíveis", digamos). Lembro-me que adorei "Exeus", livro anterior do Dennis. Mais do que este. Algumas características estão presente em ambos, como os poemas com tendência concreta, ao experimentar dispôr as palavras de forma não habitual. (na orelha, o editor e poeta j. gehlen pede para que o leitor não o veja como um poeta concretista, nem como simbolista, visto que dennis também aposta na musicalidade). Quanto à musicalidade, é nítida. vide os dois poemas acima. É um efeito muito interessante. Sinfonias noturnas, nesse caso.
Dito isso, vou-me embora que já é hora. Os dois poetas estão mais que recomendados.


PS: Eu ia falar também de "Imitação de espelho", de Ramone Abreu Amado, que tenho aqui em casa e também saiu pela mesmo editora dos 2 acima. Mas esse achei chato pra chuchu e abandonei. Quero retomar, mas fica pra outro momento. e é bom que retome mesmo, porque posso mudar de ideia quanto ao julgamento do livro, coisa que já aconteceu.

Notas inúteis:

¹ Repare que "viagem total" tem sido considerada cotidianamente, de um modo vulgar, como "besteira", "coisa tosca, sem sentido". O que é um erro. O sentido que empreguei, está claro, é o primeiro. De viagem mesmo. Viagem total de besteira não tem nada. Pelo contrário, é uma maravilha.

² "bom pra chuchu" sempre foi uma expressão brega pra mim. mas após ler "O apanhador no campo de centeio", livro de J. Salinger, cismei com a expressão-bordão do protagonista (ou pelo menos, a versão que o tradutor escolheu), o holden (adorei ele, é por isso). acho essa coisa (de as palavras entrarem e sairem de moda) algo muito legal. ainda mais porque é algo hiper-mega-ultra pessoal.

13 de novembro de 2010

menina passarinheira

para a daia


passarinho me contou
que meu amor estava infeliz
xinguei o metido, mirei nele
errei por um triz

ainda sim,
fui lá ver o meu bem
lá onde moramos
longe pra caramba
na corda bamba
no trilho do trem

bati na porta da caverna
e divisei no fundo no canto na beira
na parte mais fria e quieta
a menina passarinheira
cadê tuas asas, perguntei
não sei não sei não sei

vish, pensei, e fui pra geladeira
catei dois copos de tapa na cara
e de soco em soco
bebedeira

que a vida bate na gente
a gente é fraco
e cai no buraco
e o buraco é fundo
diz a canção

mas a vida
não morre na rima
sorte a nossa
querida

e tem outra coisa
menina aguerrida
tristeza não é problema
pelo contrário
comprida felicidade
é coisa de otário
compreende o esquema?
pois explico

quanto maior o salto
maior a perna

fiquemos tristes, tristes
como dois tigres tristes
que quando a alegria vier
ninguém vai segurar
alegria presa
quando vem
violenta
violeta
estoura um trem
dentro da gaiola
louca
coração último
céu de nossa boca


é, menina passarinheira
diz a lenda que tá sempre triste

e sempre lá é hora?
chuta esse prato de alpiste
e vamosimbora

10 de novembro de 2010

um barato fundamental




eterno ex-estranho
ainda que eu não entenda
o vice rouco
do seu louco verso

de poema em poema
te entranho

7 de novembro de 2010

cheguei hoje à conclusão de que não consigo manter um diário ínfimo, não rola, sai falso. o do harry laus é interessante, tô lendo. cara inteligente, ele. tem uns malabarismos straños ao escrever, mas isso é estilo, não? curti ele porque gosta do dostoiévski e é um cara um tanto deprimido. era né, que morreu faz tempo. tem uma passagem que gostei, onde está?, peraí, eu já acho. por favor, peraí. (sério, só mais um instante). demorei, vc não percebeu eu sei, pq a daiane me chamou aqui pra pedir uns nomes de autores que fizeram inovações linguísticas, mas isso não vem ao caso. ó o trecho de que falava:

"Onze de maio de 1950, talvez não me tenhas dito nada. Ou quem sabe me disseste, como terão dito todos os outros dias, e eu nada tenha compreendido?"

Puta desconsolo, isso. Na verdade, o trecho era outro, mas quando fui buscá-lo não achei. mas havia este outro trecho aí  de cima. sei lá. se eu tivesse bebido, diria estou deprimido ou foi efeito do vinho? mas é meio-dia. estou deprimido ou foi efeito do almoço materno? preguiça que não é preguiça, chamam de tédio, né, corali? noite que não é noite. O caso é que isso não é momento. é fase. de lua. vai e volta a maré amarrada no dedo do menino brincador.  queria que fosse momento macunaíma, mas nada tem disso. momento holden caulfield/leminski, perhappiness. Sei cá, mews. Hoje é domingo, MAS ISSO NÃO É UM PÉ DE CACHIMBO, diria o Magrinho, aquele pintor francês surrealista. surreal. surrealista. engraçado, esses jogos de palavras não combinam com o que pretendem representar. surreal/surrealista. coisa mais óbvia, de sonhado isso num tem nada. gosto do Magrinho. Mais do que o Dali, aquele mais derretido. Gosto do Magrinho pq ele é daqueles que botam uma porta no teto e saem passeando por dentro das gotas. desses que botam um leão em cima da cama. Há um leão em cima da minha cama, às vezes. é engraçado. isso dá um poema, se pá. ou dava, que não sou poeta. tentei, tentei. mas sou muito bobo. uma noite sentei a Beleza no meu colo e achei uma delícia. É assim que os maus poetas se mostram. tá tocando um som bom aqui, Red House. sensual. é bom que a música distrai. não tô mais deprimido. ok, foi brincadeira, ainda estou. e escrever é coisa que não ajuda. tenho baita preguiça, talvez por isso não funcione um diário. Laus, sete de Novembro pode estar falando, numa hora dessas, será? vou fazer um minuto de silêncio, para tentar ouví-lo. aproveito e velo o tal de seis de Novembro.