30 de abril de 2011

se estou com o vento, me dessarrumo

pois então, seu eliot
abril também sabe ser cruel
para as bandas do sul

confuso tempo este,
de frutos podres
e sabida doçura
de ruas apinhadas de pessoas com pressa
a tomar os mais longos caminhos
para suas cascas

mas,
como tudo, abril passa
e cede lugar a verões fora de época
perdidos fogos sem estrebarias
aladas sementes sem norte

e como toda chuva,
abril passa
abril poça
escuro caldo de memória e desejo, seu eliot

17 de abril de 2011

rosa me dizendo que amizade dada só pode ser amor,
mas o que dizer desses encontros furtados
choques cotidianos de gentes com pressa
esse oi tudo bem
sim, tudo ótimo
onde o amor nessa retórica torta
contra a qual não se reclama
como não desarmar-se, sorrir
diante de quem
pergunta tá tudo bem
sim
até mais ver

a palavra lançada não volta
só traz dor
a busca pelos dardos

não há autópsia possível
não há marca evidente do tiro
a palavra lançada não volta

pássaro imortal
a palavra lançada
não há

três somem

três somem
no escuro do quarto

e deste ballet
de impossível sincronia
é preciso um afogado

para que o amor escape
mais uma vez
                       por um tris
                                                     te

16 de abril de 2011

poema de Alcides Buss

De ler e andar


Há dias em que há

mais sentido nas ruas

do que nos livros.

Nesses dias se deve

de casa sair

e, dentro de si,

caminhar à escuta

da vida.



Há dias,

porém, em que mais

sentido há nos livros.

É preciso, então,

trancar-se em leituras

e, numa entrega de sonho,

misturar-se ao mundo


Alcides Buss

 
In: poesia para gostar de ler poesia. editora letradágua.

11 de abril de 2011

amores de vanguarda morrem cedo:
essa paixão,
dançada na corda
de bambas pernas,
já nasceu queda

e eis o bar
essas duas cadeiras sem mistério algum
esse jogo de persianas

acudam-nos garçons
piratas
e deuses
de última hora
que
vamos repensar a rota desse barco
essa sala de ausências:

onde pôr o amor
se não há vagas
no mar?
onde, sol, se põe
o amor
onde o sal,
onde o ciúme
essa tequila dos olhos?

precisamos propor
exercícios aos corpos:

(não sonhar com cavalos
a correr
em verde campo
imagem por demais pintada
e já sem agruras)

(descansar braços pernas
fazer da língua sutil arma branca
contra nossa arvorosa
 correnteza)

(desaprender
(os cílios
(joelhos
(e ouvidos
(voltar a ser cinema de sustos
imitação da chuva
singradura contra as pedras

oh, sim,
precisamos desarmar esses corpos
que amar também é ruir aos poucos
e casais se alimentam das migalhas de outros amantes

o amor canonizado
ai dele,
coitado
zeus nos livre fazer da paixão
um ponto de referência

tratemos de sorver aqui
nosso cálice de absintimentos
brindar o gratuito
saudar o banquete dessa época
viver essas ruas
a profusão de meninas
nosso
barco de cristal

10 de abril de 2011

rosas se agitando
jerry lewis na vitrola:
o rock ou o vento?

9 de abril de 2011

Um homem entra numa escola e mata várias crianças. Graças às suas caixas mágicas, todos no país passam a saber do ocorrido rapidamente. e não há quem não se comova, ainda que não queira pensar no fato. Porque se pensarmos um pouco só sobre o ocorrido, se desenharmos na mente, ainda que de forma tosca, um grupo de crianças sendo mortas; se imaginarmos, ainda que precariamente, que vida levava apenas uma dessas 12 crianças (do que gostava, como era seu rosto, o que pretendia fazer nesse fim de semana) cairemos num fosso interminável. notícias assim levam um pedaço da gente de forma silenciosa. roubam alguma coisa nossa que não tem nome. e, por não ter nome, sentimos o furto delas mas não reclamamos, pois impossível. as famílias das crianças que se foram desmoronaram. os outros, o resto do país, continuam de pé. nós continuamos de pé, seguindo. Apenas ruímos um pouco. E por quê? Porque já temos fardos suficientes, agruras diárias, pequenas tragédias. Não podemos atolar diante de cada tragédia que nos fere. O que seria de nós se carregássemos às costas todas as mortes que nos comovem? Por isso a dor breve, o furto sentido mas não reclamado. Por isso essa pequena ruína. Por isso já ligamos o rádio, abrimos um livro de contos. Por isso já combinamos de dançar hoje à noite e quem sabe passear na praia amanhã (se der sol). Ah, o esquecimento, essa faca de mil gumes. Se nesse momento ainda retumba na mente o assassinato das crianças, é certo que irá passar. Logo uma outra tragédia irá tomar seu lugar. Quem sabe um famoso goleiro matando de forma cruel uma mulher. Ou talvez um pai que atira sua filha pela janela do apartamento onde moravam. Certo é que há de vir. Enquanto isso, prossigamos ruindo, que a vida não pára. "Dá-me mais vinho que a vida é nada", disse Pessoa.

6 de abril de 2011

falou Bolaño

“Soy mucho más feliz leyendo que escribiendo.”


Roberto Bolaño

3 de abril de 2011

um velho drama moderno

Avatar 1:
"Acho essa comunicação via internet problemática, as pessoas em geral não tem compromisso (por exemplo, de responder uma msg, ou sente uma necessidade real de partilhar), é tudo muito superficial, 645 amigos, imagina, não fazemos sequer 10 amigos verdadeiros ao longo de toda a vida, os que derem sorte talvez 20... O que passa disso é outra coisa qualquer, porque amizade é como amor, exige dedicação, que se arranje aquele tempo que não se tem, que se esteja disponível e necessitado ao mesmo tempo. "




Avatar 2:
"vc tem razão, é muito difícil que das comunicações pela internet (sempre muitas, e sempre muito rápidas) saia algo sequer próximo de uma amizade como a que temos com nossos amigos na "vida real". porque a presença, o toque, é algo fundamental que a internet não possibilita. somos avatares que conversam. existimos nisso que escrevemos? sim. mas será uma existência virtual, frágil, que dificulta muito amizades, coisa que vc definiu muito bem."

extraído de uma conversa internética, numa dessas várias redes sociais nas quais a gente se perde.


PS: não quero soar fatídico, pessimista. acho, sim, que da troca de e-mails, cartas, recados,sei lá o quê, podem surgir amizades, que podem ser mantidas por anos. mas é raro.

entrevista com lídia jorge




Bruno, rapaz muito gentil, mostra-me esta entrevista com a escritora portuguesa Lidia Jorge.

um tanto longa, mas interessante.


um trecho da fala de Lídia:

"eu gosto imenso dos leitores que leem lentamente porque são aqueles que são capazes de respeitar na leitura aquilo que é o movimento interno de nosso pensamento."

2 de abril de 2011

Enfim, mais Walser

O público brasileiro contava com apenas um livro do suiço Robert Walser: "O ajudante", editado em 2003 pela Arx, em tradução de Zé Pedro Antunes. Apaixonei-me pelo romance que acompanha os passos de Joseph, um jovem que vai morar na casa de seu patrão, o engenheiro Sr.Tobler (o enredo do livro é mínimo. a graça está no modo como o autor apresenta os dramas íntimos e as reflexões do jovem em face da realidade falida que o cerca.)

Desde então eu vinha torcendo por novas edições no brasil, já que em portugal há várias traduções de walser (esses gajos, sempre na frente...). E agora ela veio: JAKOB VON GUNTEN - Um diário, que sai pela Companhia das Letras, com tradução de Sérgio Tellaroli.


Um viva pra Companhia! :))))))
Outro viva pro meu bolso furado!  :((((((