28 de agosto de 2009

Ready-made

I



Traiz de lá:

arroz
feijão
pexe, se dé
farinha
carne
dois1saco de leite

e tu tamben

Dora


II

CUIDADO, CERCA ELÉTRICA

o pequeno só sabia ler arame farpado


III

NOIVOS

-- Tonha, se eu te pedir em casamento, ocê aceita?
-- Ara, prá saber isso você tem que pedir!
-- Tá. Mas se eu pedir ocê diz que sim? Diz?


IV

DECLARAÇÃO

Declaro para os devidos e honrosos fins, que em breve darei a eles o que é de direito.
Solicito, por fim, um pouco mais de paciência aos devidos e honrosos fins.

Atenciosamente,
Eu

V

MUNDORANDO

O último a sair
que apague o sol


VI

DICTATA

Aluno: Eu

1- PoESia
2- poi e ésis
3- poezia
4- Poe e cia
5- pohesia

VII
CASTIGO

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VIII

REGRAS PARA OS SÓCIOS

é terminantemente proibido entrar nas piscinas trajando smoking, écharpes, vestidos transparentes, bem como sapatos mocassim, sob pena de multa.


IX

Enc: E-MAIL

O senhor é meu pastor. Nada me faltará.

Envie essa mensagem para mais 99 pessoas, pois assim você sempre estará totalmente coberto pela lã dura e quente do Senhor.

Amén.


X


AS MISSIONÁRIAS DO SANTO JESUS CRISTO

desde às 6 da manhã, com os folhetos da missão.
venha para nossa igreja
desde o café ralo até o meio-dia.
A mão de Deus quer puxá-lo dessa vida sofrida
O chão: uma caricatura suja e acadêmica do céu.
Isaías 3:4-12
folhetos para todo o lado
O céu está azul hoje, né?
Igreja do Nosso Senhor
Não quero, obrigado
Ruas compridas
Ai, tô cansada.
Que Deus lhe guarde
É meio-dia
chão de santos
céu de chuva
Contamos com sua presença

Insegurança

sempre que escuta um barulho, de madrugada
carrega a arma e o sobrolho
e entra em casa para averiguar

25 de agosto de 2009

Teu drama

Em teu olhar,
um éter barato
esgares toscos: muito reais.

belo retrato que tu pintas:
triste língua sem rumo
os olhos, vermelhos
(esse éter falso te vicia)
bailam bailam
em teu carnaval quase-íntimo

Carnaval
Carnaval
Carnaval
isso é a soma sem fim
a receita esquecida
de muitos gestos e muitas palavras

como um tapa de mão aberta
te apresento a outros carnavais
o meu
o do vendedor de sorvetes
o do vizinho cego
da criança enlaçada pra presente

Carnaval, Carnaval, Carnaval
sentes o gosto desse tempo?

A vida é uma festa, estrela:
milhões de carnavais a despontar
uns sobre os outros
em medonha algazarra

Junte-se a nós, estrela.

24 de agosto de 2009

Ser guiado

A partida: os olhos rendidos,
olhos caídos.

os olhos vendados
chão e teto vedados
- as paredes-
a balançar como redes

A viagem:
olhos distraídos

De repente desfecho
clarão de gênesis

o mesmo mundo,
de paredes fixas - horizonte
o mesmo mundo
mas os olhos estão fora:
desajeixados

A chegada (re) partida:
olhos traídos

21 de agosto de 2009

O último passeio de um tuberculoso, pela cidade, de bonde.

dos salões abertos saem pianos enxotados
a abanar suas caudas
há luzes que brilham do farol lugar-nenhum
há crianças e há babys
há mademoiselles
há mulheres
e há marias-de-papel

das janelas fechadas
dos sorrisos abertos
dos salões
dos comércios

vêm choros, chorinhos
vêm gritos
sussuros
ulular de crianças

há pretos
há brancos
há homens de cara amarela
e mulheres de pele azul

nas ruas
nos tetos
há quem flane
no fora
no dentro
há quem inflame

fogo
chuva
vento e riso
dos palhaços circenses vendedores de jornal
(Extra! Extra! Jesus nasceu! Ide fazer os versos de circunstância!)

dança e coro
oração
modinha
coração bate
no fox-trotar dos cavalões

e
gaita
e chuva
e miado e ganido e gargalhada a balançar:
sacolejo sacolejo

dos anti-aquários salões
vem o refrão do amanhecimento
entoado no sorriso
de alguém ébrio que nada bebeu do licor da vida
e se atirou




* Título do primeiro poema em versos livres de Oswald de Andrade, em 1912. O autor o escreveu e o rasgou. O poema cometido acima, é, pois, uma humilde homenagem.

16 de agosto de 2009

Striptease

de repente me cubro.
caos:
sufocáustíco

de repente forno
calor do texto
me envolvo
mais palavras mais palavras:
tentáculos decepados
boca em fisgadas
me cubro

pouco a pouco
cada vez mais nu

14 de agosto de 2009

do trânsito

os relógios biológicos
passam depressa
tic tac tic tac
tic tac tic tac

ctacittciatcctiacitctaticatcittct
citcacttacictcaictctiatcaitcataictaiatcictitactaictiactiatcitacitacitaictiatcitaciactctaciaiitcacatcitacitacictiatcacittiaci
iatcitacctaitc
atciatciatctcicitatctacictaitc
iatcitactiactic

os relógios batem
batem depressa
com força
estrondo

batem com suspense

tic tac
tic tac
tic tac
tic tac
tic tac
tic tac
ah, meu Deus
tic tac
tic tac
tic tac
tic tac

Nas esquinas,
alguns explodem

12 de agosto de 2009

da economia vocabular

quebrar o silêncio da sala de jantar
com boca louca:
prata cheio de palavras
palavras palavras palavras
nhac-nhac palavras palavras
(com a boca aberta, bem alto)


ou


simplesmente gritar:
Porra!
simplesmente bater na mesa
Gemer.
Limpar discretamente a garganta
arrotar.


ou ainda (nota máxima, gozo dez)


fechar os olhos
e, no escuro, se entregar aos sons
sons que estão em todos os cantos
frestas
esfíncteres
tampas
e bocas:

os sons que se escondem na fria sala de jantar

Breve resumo das idas e vindas brasileiras

Eu me vou por esse mundo

Mas não permita Deus que eu morra
sem que eu volte para lá.

9 de agosto de 2009

Musa

corpo de palavras:
o gesso nunca falou tanto

A cama desfeita, teu corpo assim tombado
sinuoso:
palavras estranhas

costas geladas, boca seca
o que, então, me atrai?

agora vejo que te falta um seio,
falta-te o seio esquerdo
teu pulso é lascado:
palavras exigem reticências

lambo
recito
olho
me faço teu pedestal
por que sei e não sei o que me atrai

esse teu seio esquerdo
cada vez mais presente
cada vez mais perto
e ele me vem na boca
e ele me vem na boca

vem, reticências, vem

e ele me vem, mas volta
e volta, revolta

esse teu seio
cada vez mais esquerdo
cada vez mais palavra
que palavra?
que palavra?

Sob Juízo

Prometo falar a verdade -
a mentira: folêgo da criação-
nada mais que a verdade