4 de janeiro de 2012

amei isso

“Agora devo falar um pouco sobre o modo como isso acontece. Eu não quero que você pense que aquela história eu sentei e disse, “Eu vou agora escrever a história de uma Ph.D. com uma perna de pau, usando a perna de pau como um símbolo para um outro tipo de sofrimento.” Eu me pergunto se muitos escritores sabem o que vão fazer quando começam algo. Quando eu comecei a escrever aquela história eu não sabia que haveria uma Ph.D. com uma perna de pau. Eu meramente me encontrei de manhã escrevendo uma descrição de duas mulheres sobre quem eu sabia algo, e antes que eu percebesse, eu equipei uma delas com uma filha com a perna de pau. Com o desenrolar da história eu trouxe o vendedor de Bíblias, mas eu não tinha ideia do que iria fazer com ele. Eu não sabia que ele iria fazer o que fez até dez ou vinte linhas antes que ele o fizesse, mas quando eu descobri que era isso que estava para acontecer, percebi que era inevitável. Essa é uma história que produz um choque para o leitor, e eu acho que uma das razões para isso é que produz também um choque para o escritor.
Agora, além do fato de que a história surgiu dessa forma aparentemente irracional, é que essa história praticamente não teve qualquer parte reescrita. É uma história que estava com total controle sobre sua própria escrita, e talvez você me pergunte como esse controle vem, a partir do momento que não é inteiramente consciente.
Eu acredito que a resposta para isso é o que Maritain chama de “o hábito da arte”. É fato que escrita de ficção é algo em que toda a personalidade toma parte – a consciente tanto quanto a mente inconsciente. Arte é o hábito do artista; e hábitos tem de criar raízes profundas na personalidade. Eles têm de ser cultivados como qualquer outro hábito, dentro de um longo período de tempo, de experiência."

Flannery O´Connor
trecho de Writing Short Stories (Mistery and Manners).


Um comentário:

Samia disse...

Eu acho que eu nunca vou consegui entender como esses autores fazem isto. Vão escrevendo, escrevendo e aí a história meio que vai se desenrolando à revelia. Podem explicar o quanto quiserem que eu não consigo entender. Por isso, mesmo acho lindo.