10 de março de 2012

vamos suspeitar desse vaso,
- este que há tempos está sobre a mesa - e crer que ali é o esconderijo das chaves de uma outra casa,
e no meio do sonho vem ele, o que sussurra, ou ela, a dos chinelos ásperos, e sorrateiros colhem a chave para abrir uma terceira noite, longe desta que é tão intacta, cada coisa em seu lugar, o meu braço, a cama, o copo d'água e mesmo o teu cabelo bagunçado parece que sempre esteve à espera desse fio de vento que te derruba para fora da cama.
vamos suspeitar desse vaso,
presente de sua mãe, e entender por que diabos o escolheram para ali guardar a chave. não seria ali entre pétalas e vidro o lugar mais seguro do mundo?  Uma colmeia, um açougue, a letra K da enciclopédia.
talvez a pergunta seja: podemos culpá-los por todos os barulhos pequenos da noite? Tua apneia assustada é o velho e a velha arrastando os chinelos - arriscaria - para dentro de nosso quarto. se coragem eu tivesse de abrir os olhos quando sinto a noite mudar de lado, talvez os visse, e parece que os ouço, casal de gnomos, um velho uma velha, e sinto como ele sussurra, respirando como um cavalo, mas sei que, abertos os olhos, eles não mais estarão, é uma noite que não nos pertence.
e pela manhã trocaremos olhares entre as xícaras, o vaso em estado de espera, as flores a brincar com os pés na água, porque assim elas vivem, uma vida de três ou quatro dias distraídos, sem revolta por não haver onde. e procuraremos rastros inúteis pela casa e combinaremos vigílias que nunca serão feitas, e lado a lado na cama, mais uma vez, já lhe passou pela cabeça o que se esconde dentro desses travesseiros?

Um comentário:

Enzo disse...

(Muita leitura pra se faxer um texto assim. Sinto que)

vamos suspeitar desse vaso,
- este que há tempos está sobre a mesa - e crer que ali

(começa Virginia Woolf)

é o esconderijo das chaves de uma outra casa,

(vira Lygia Bojunga)

e no meio do sonho vem ele, o que sussurra, ou ela, a dos chinelos ásperos, e sorrateiros colhem a chave para abrir uma terceira noite,

(Fernando Karl feelings)

longe desta que é tão intacta, cada coisa em seu lugar, o meu braço, a cama, o copo d'água e mesmo o teu cabelo bagunçado parece que sempre esteve à espera desse fio de vento que te derruba para fora da cama.

(Maria Gabriela Llansol)

vamos suspeitar desse vaso,
presente de sua mãe, e entender por que diabos o escolheram para ali guardar a chave. não seria ali entre pétalas e vidro o lugar mais seguro do mundo?

(Carlos Drummond de Andrade)

Uma colmeia, um açougue, a letra K da enciclopédia.
talvez a pergunta seja: podemos culpá-los por todos os barulhos

(Ryana Gabech STYLE)

pequenos da noite? Tua apneia assustada é o velho e a velha arrastando os chinelos - arriscaria - para dentro de nosso quarto. se coragem eu tivesse de abrir os olhos quando sinto a noite mudar de lado, talvez os visse, e parece que os ouço, casal de gnomos, um velho uma velha, e sinto como ele sussurra, respirando como um cavalo, mas sei que, abertos os olhos, eles não mais estarão, é uma noite que não nos pertence.

(ANA C. EXTREME)

e pela manhã trocaremos olhares entre as xícaras, o vaso em estado de espera, as flores a brincar com os pés na água, porque assim elas vivem, uma vida de três ou quatro dias distraídos,

(Ferreira Gullar best moments)

distraídos, sem revolta por não haver onde. e procuraremos rastros inúteis pela casa e combinaremos vigílias que nunca serão feitas, e lado a lado na cama, mais uma vez,

(Priscila Lopes)

já lhe passou pela cabeça o que se esconde dentro desses travesseiros?

(China in Box - biscoito da sorte)