18 de outubro de 2013

Deixa eu ver se explico o porquê dessa festa num dia que as pessoas se esforçam pra que seja triste. Conheci a tua mãe numa aula de lambaeróbica. Na verdade, mal nos falamos durante as aulas. Fui conversar e conhecer e me apaixonar depois do dia em que fomos ao cinema. Tua mãe era muito estranha: ora dizia umas coisas muito lindas e ora falava umas merdas, de modo que fiquei em dúvida se a convidava para ver um filme de hollywood ou algum filme b, daqueles mais franceses, sabe. Na dúvida, chamei ela pra ver um filme c, num cinema pornô que ficava ali no centro e que há um tempo fechou pra dar lugar a uma igreja evangélica. Ela achou o enredo do filme ruim, mas elogiou a trilha sonora e a fotografia. Daí em diante fomos a muitos lugares e muitas coisas por lá fizemos: cinemas, missas, terreiros, açougues, museus, convenções de microempresários, terapias em grupo, reuniões de associações de moradores, vernissages, casa de massagens, hospitais e bem, em algum desses lugares fizemos você. Ai, ai, fazer você. Isso me lembra de quando vc tinha quatro anos e tua mãe contou pra vc como vc nasceu: disse que um quero-quero havia trazido vc numa trouxinha e explicou que, se nos estados fudidos os bebês eram trazidos pela cegonha, que era muito simpática e bondosa, no brazil os babys eram entregues por quero-queros chatíssimos que não aceitavam reclamações ou pedido de troca. ai de vc se reclamasse ou dissesse que não queria menina, e sim menino: o quero-quero metia-lhe uns rasantes e aí era ferroada na bunda da mãe e do pai sem dó. É claro que não reclamamos de vc, e por isso o quero-quero até que nos atendeu muito bem. Tanto que sua mãe pensou em te chamar de Kevin Kevin. Tipo uma homenagem, saca? Convenci ela de que as pessoas não pegariam a poesia e aí ficou só Kevin mesmo. O que vc prefere? Bom, agora é tarde, nem responda. E me deixa falar mais dela, pois disso nunca canso. Ai, a gente se divertia muito. E brigava às vezes, é verdade. Mas não duravam muito os conflitos, pois no meio das brigas eu descobria alguma coisa amável nela e dava um jeito de acabar com aquele folhetim. Como aquela vez em que, depois de muito chorar, ela tirou a meia do pé para assoar o nariz. Ai, como era sensível tua mãe. Quando a lokura do amore baixava, e eu sentia a necessidade de me reapaixonar por ela, ia com ela ao mercado. Numa dessas vezes saímos para comprar mostarda e ketchup pruma pizza que assaríamos. Sua mãe olhou e reolhou pros condimentos e disse: "Que horror essas embalagens de mostardas. São todas, todas, todas mesmo, amarelas! E os ketchups...., cristo, são todos vermelhos! Quando vão criar uma embalagem rosa ou azul? Credo!" Ela ficou tão chateada com os fabricantes que decidiu que não compraríamos mais nada. Detesto pizza a seco e aí tive a brilhante ideia de sugerir aquela variante holandesa, observando a ela que, bem, existia uma mostarda marrom. Ela comprou-a, mas meio ressabiada. Tua mamis detestava as coisas que eram muito iguais, ou facilmente adivinháveis, previsíveis. Por isso odiava shows de mágica, entrevistas e poetas, e por isso gostava tanto de acompanhar a previsão do tempo, a bolsa de valores e os resultados da loteria. Sua mãe gostava das coisas pelo avesso, sabe. E é por essas e por outras que sempre nesse dia compramos um bolo gostoso e velas pra soprar em vez da gente ir no cemitério levar flores pro túmulo dela, entende?

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