9 de abril de 2011

Um homem entra numa escola e mata várias crianças. Graças às suas caixas mágicas, todos no país passam a saber do ocorrido rapidamente. e não há quem não se comova, ainda que não queira pensar no fato. Porque se pensarmos um pouco só sobre o ocorrido, se desenharmos na mente, ainda que de forma tosca, um grupo de crianças sendo mortas; se imaginarmos, ainda que precariamente, que vida levava apenas uma dessas 12 crianças (do que gostava, como era seu rosto, o que pretendia fazer nesse fim de semana) cairemos num fosso interminável. notícias assim levam um pedaço da gente de forma silenciosa. roubam alguma coisa nossa que não tem nome. e, por não ter nome, sentimos o furto delas mas não reclamamos, pois impossível. as famílias das crianças que se foram desmoronaram. os outros, o resto do país, continuam de pé. nós continuamos de pé, seguindo. Apenas ruímos um pouco. E por quê? Porque já temos fardos suficientes, agruras diárias, pequenas tragédias. Não podemos atolar diante de cada tragédia que nos fere. O que seria de nós se carregássemos às costas todas as mortes que nos comovem? Por isso a dor breve, o furto sentido mas não reclamado. Por isso essa pequena ruína. Por isso já ligamos o rádio, abrimos um livro de contos. Por isso já combinamos de dançar hoje à noite e quem sabe passear na praia amanhã (se der sol). Ah, o esquecimento, essa faca de mil gumes. Se nesse momento ainda retumba na mente o assassinato das crianças, é certo que irá passar. Logo uma outra tragédia irá tomar seu lugar. Quem sabe um famoso goleiro matando de forma cruel uma mulher. Ou talvez um pai que atira sua filha pela janela do apartamento onde moravam. Certo é que há de vir. Enquanto isso, prossigamos ruindo, que a vida não pára. "Dá-me mais vinho que a vida é nada", disse Pessoa.

2 comentários:

Aninha Kita disse...

Ótima reflexão!

No caso do "pai que atira sua filha pela janela" pensei muito nisso. Acompanhei muitas reportagens, como muitos me permiti chorar, e nem fiquei a saber do fim do julgamento. Outra notícia tomou o lugar, provavelmente. E ainda hoje vamos esquecendo, ainda que sofrendo.

Beijos, beijos!
Ana

Samia disse...

Gostei tanto desse post. A frase inicial que causa impacto, a maneira como você mostrou a reação de todos nós, a indiferença necessária para continuarmos, a vida que continua apesar do horror e da impotência, mas não tem jeito algumas marcas ficam, e o final que amarrou tudo tão bem.