faça de conta que isso é um telegrama imenso: se faltarem explicações, se palavras forem cortadas, foi para deixar mais barato. telegrama imenso, haicai de três folhas, trevo de cinco dedos e oh meu deus, nunca consigo dar as respostas que você quer, sempre te ofereço esse buquê de saídas, portas que levam a novas perguntas, e assim passam-se as horas e os dias e parece que nunca saímos daquela conversa no telefone, vc me dizendo o quanto-me-gusta-and-how-disgusting-is-it, e eu ali coçando a ponta dos meu dedos, essa arte que vc sempre ignorou, e eu ali dizendo sim, também te gosto, sim, meu nome é amália, e eu agindo como se do outro lado estivesse um atendente de telemarketing qualquer, e talvez seja um pouco disso, talvez do outro lado vc me convencesse, por meio de elogios e anedotas a comprar algo que não queria, e eu não sei meu cpf, aguarde na linha um instante, sim?
e vc aguardou, e guardou isso na testa como um troféu, veja como sou paciente, como se isso garantisse qualquer coisa: amor não é maratona, querido. e vc me pergunta na carta se sei o que é o amor: se soubesse estava longe e rica, vc sabe. não o entendo e não sei como se chama: o que sei do amor é aquilo que ele não é, e isso sempre me bastou
te deixo uma lista:
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eu não sei, claro que não sei. como não sei o que me move a te escrever e procurar duas ou três respostas que acalmem essas 18 perguntas (eu contei) que vc manda na sua cartinha. gosto de vc e te quero bem, e é uma pena, eu tenho vontade é de escrever carta maldosa e sarcástica, sempre sonho com brigas homéricas, sonho com gente puxando briga comigo por carta, irmãs e amigas, só para eu poder mandar algo à altura. mas isso quase não acontece: a maioria é gentil, como vc é, um poço de gentileza, um poço seco de gentileza cravado num deserto de gentes. o mundo é gentil. falsos ou sinceros, o mundo borbulha de gente bacana, bonita e gentil. seu pária, não é disso que preciso.
(acho que com essa última frase eu respondo 4 ou 5 das tuas perguntas).
tua carta toda é um convite a olhar pra trás e ver o "que deu errado",
embora eu não goste desse teu jeito prático de ver os erros:
amor não é carro que vc levanta o capô, mexe no motor e logo encontra
as falhas. [o amor não é tanta coisa, me lembra meu avô que saía
de madrugada pra jogar cartas e voltava seis da manhã para uma
chuva de imprecações de minha vó, a dizer vc não é uma formiga,
um cocozinho de barata, vc é menos que areia, seu puto, mas isso
é uma história velha e vc chegou num ponto que não quer mais ouvir
minhas histórias. vc quer saber onde tem erro, vc quer okays
e continências, ok, vamos lá], vamos à sessão espírita, pq nisso acredito: isso de olhar pra trás é ver nossas vidas passadas:
à cada dia nos reinventamos,
somos outros no dia seguinte,
então pare de olhar pra trás e me apontar: aquela não sou eu.
é fotografia, carcaça alegre de cobra,
um casaco que larguei no banco da praça
porque o calor estava imenso
como este telegrama
Sim, houve alegria
E dias toscos, noites sem sentido e algum sexo,
E discussões mornas e dias em que a luz acabou, e tardes de chuva, piadas sem-graça que seu tio contava nas vezes em que te visitei. Houve milhares de eventos e cada um deles tem um pedaço perdido, e se unidos talvez explicassem porque estamos assim um contra o outro:
teu nome num lado da carta e o meu nome na outra
Mas não dá para montar, o tempo vai roendo, imperturbável, essa porta que um dia escancaramos naquela conversa de telefone. Nossos erros, como o amor, não tem nome, bebê. Faça de conta que a vida é um telegrama imenso, repleto de palavras e ainda assim cheio de lacunas. O que não entender, invente pt saudações
5 comentários:
vou te guardar num potinho
"só love, só love
só love, só love
só love, só love,
só love,
só looo ve."
ninguém me leva a sério nesse blog.
Eu levo.
Até demais, penso.
;)
;)
;)
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